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Skinheads – A Força Branca (1992)

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Skinheads - A Força BrancaAssim que terminei a polêmica resenha do filme anterior (a quantidade de pessoas que comentaram sobre ela comigo em particular, alguns inclusive querendo link para o o material, foi impressionante 😆 ), folheei o “1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer” e procurei por algo mais “sério” para assistir. Foi lá que encontrei esse Skinheads – A Força Branca, obra prima do cinema australiano da qual eu nunca havia nem ouvido falar e que me sinto feliz tanto por ter assistido somente agora (visto que as questões que ele aborda são pontuais para tudo que está acontecendo atualmente no mundo) quanto por poder ajudar a divulgar.

A história segue as ações de um grupo neonazista comandado por Hando (Russell Crowe). Adorador de Hitler e defensor da ideia de que “os amarelos” (asiáticos, principalmente vietnamitas) estão destruindo a cultura de seus país e ameaçando sua existência, Hando e seus seguidores realizam ataques diários àqueles que eles elegeram como inimigos. Na cena que abre o filme, o diretor Geoffrey Wright nos dá uma boa amostra do que o grupo é capaz. “O que você está fazendo aqui? Este não é o seu país”, diz Hando antes de espancar um adolescente até a morte.

Se essa cena choca, o que vem na sequência (apesar de menos gráfico) não é menos ultrajante. Hando conhece e envolve-se com Gabe (Jacqueline Mckenzie), uma adolescente que está vagando pela noite sem muitas perspectivas depois de abandonar um namorado viciado em drogas. Após transarem em um quarto repleto de objetos nazistas (a parede do fundo, por exemplo, é coberta com uma bandeira do Terceiro Reich), Hando explica para Gabe as origens de seu ódio racial. Segundo ele, as pessoas ricas da Austrália encheram o país com “lixo humano”, asiáticos que são usados como mão de obra barata. Ele não quer ser um “escravo branco” em seu próprio país, ele quer que as pessoas saibam que ele orgulha-se de sua “história e de seu sangue de branco”. Na sequência, fechando a verborragia, ele saca um exemplar do Mein Kampf, um dos pilares da ideologia nazista, e lê um trecho que relaciona a decadência das “culturas nobres do passado” com a contaminação provocada pela “semente das raças inferiores”. “O sangue da raça deve ser preservado na sua pureza, a qualquer custo”. Gabe, que revela-se uma garota impulsiva, fútil e sem nenhum tipo de cultura, ouve isso tudo e sorri, impressionada. Quem tem um mínimo de bom senso/conhecimento, porém, é avisado pela contração involuntária do estômago que esse pensamento nacionalista/supremacista, além de repugnante, fatalmente levará à violência e destruição, e é exatamente isso que vemos em seguida.

Skinheads - A Força Branca - Cena 1

Depois de ser avisado que “um bando de amarelos” comprou o seu bar favorito da cidade, Hando reúne seus comparsas e parte o local para expulsá-los. Acontece, porém, que os asiáticos haviam organizado-se após a morte do garoto (aquela que abre a trama) e, dessa vez, eles estavam prontos para revidar. Hando e os demais skinheads, entre eles Davey (Daniel Pollock), um brutamontes descerebrado, até levam vantagem no início, surrando sem dó dois funcionários do tal bar, mas aí começa a surgir vietnamita de tudo que é canto e os neonazistas sentem na pele a violência que eles estavam acostumados a praticar. Aqui, a mágica do cinema acontece, nos permitindo vivenciar no ambiente relativamente seguro da arte sentimentos e sensações que não podemos praticar na vida real, seja por questões morais ou legais. Como é bom ver aquele discurso supremacista sendo enfrentado à altura! O grupo de Hando toma uma surra épica (alguns deles inclusive morrem), com direito a tijolada na cara e tudo mais, e só lhes resta fugir com o rabinho no meio das pernas. A partir daí, o grupo esfacela-se e o filme assume um tom menos de ação, mais dramático, para expor a hipocrisia e a podreira moral de Hando.

Russell Crowe, que sem dúvidas é um dos grandes atores de sua geração, dá vida a um protagonista intragável. Todos os símbolos da barbárie estão lá, desde o copo de leite que é bebido religiosamente ao acordar até as tatuagens com símbolos nazistas, mas o que mais me chamou atenção foi um diálogo em que ele dá bronca em um membro da gangue porque o cara demonstrou interesse em trabalhar servido ao exército. Hando acusa os asiáticos de invadirem seu país, contaminarem sua cultura e roubarem empregos dos nativos, mas ele mesmo não quer trabalhar. Durante a relativa 1h32min de duração do filme, aliás, o personagem não faz nada além de praticar furtos, embebedar-se, ser machista e brigar. É isso que define uma “raça pura”, uma “cultura nobre”?

Skinheads - A Força Branca - Cena 2

Claro que não. A ideia de nacionalismo e de raça enquanto fatores segregadores de povos nasce no século XIX na esteira da formação dos estados nacionais europeus modernos e na divulgação de teorias científicas, como o evolucionismo de Charles Darwin. A necessidade de definir uma identidade nacional baseada em fatores como língua, religião, símbolos (hino, bandeira) e ancestrais e acontecimentos históricos em comum levou à formulação de uma série de teorias que não só identificavam esses povos, mas que os comparavam entre si, como se uns fossem mais “evoluídos” do que os outros (o que recebe o nome de darwinismo social) e, portanto, estivessem mais aptos para conduzir o processo civilizatório do mundo. Nisso, temos caras como o inglês William Graham Sumner dizendo que o estado que promove igualdade favorece a sobrevivência do mais fraco, o que “leva a sociedade para baixo e favorece todos os seus piores membros” e o relativamente conhecido Francis Galton (também inglês) criando a chamada “eugenia”, umas espécie de limpeza racial que o estado deveria promover canalizando recursos públicos somente para os considerados “racialmente valorosos” e proibindo o casamento/esterilizando os “socialmente inúteis”, tudo isso visando evitar a miscigenação racial dos brancos com as “raças inferiores”, o que levaria ao seu enfraquecimento. É esse tipo de baboseira que atravessou o século e serviu de base para o surgimento do nazismo, é esse tipo de babaquice que fez ninho na cabeça oca de Hando.

Skinheads – A Força Branca, na sua metade final, explora as fraquezas teóricas do supremacismo através das contradições e da baixeza moral de seu protagonista, e revela o caminho robespierriano que aguarda os propagadores de ideias extremas. Apesar de seus quase 30 anos, é um filme bastante atual (não é bizarro que, no Brasil, um país que carrega a marca da miscigenação desde a sua origem, haja grupos neonazistas?) e merecedor da sua atenção, tanto pelas discussão que suscita quanto pelo fator entretenimento, que é dos maiores caso tu goste de ver a idiotice humana engolindo a si mesmo (e tomando tijolada na cara).

Skinheads - A Força Branca - Cena 3

Los Angeles – Cidade Proibida (1997)

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Los Angeles - Cidade ProibidaO feio e o belo, o vil e o honesto e a mentira e a verdade confundem-se constantemente nesse Los Angeles – Cidade Proibida. A trama, uma mistura de ficção e realidade protagonizada por personagens cheios de contradições, trata de desconstruir a imagem glamourosa e onírica de uma das mais famosas cidades americanas. Baseado em um romance do escritor James Ellroy, o diretor Curtis Hanson nos dá uma boa visão de parte da podridão envolvendo corrupção, violência policial, tráfico de drogas e prostituição que residem debaixo do tapete de Los Angeles e, durante o processo, nos entretém com elementos de metalinguagem e uma clássica história de detetive.

É natal. As casas estão enfeitadas e os corações estão cheios de boas intenções, mas quem olhar um pouco mais atenciosamente perceberá a tensão que há por trás daqueles sorrisos regados a champagne. A prisão do gângster Mickey Cohen deixou vago o posto de rei do crime de Los Angeles e agora todos estão ansiosos para saber quem o sucederá e como isso será feito. Nesse cenário pré-conflito, três policiais vivem seus dilemas pessoais na noite natalina.

  • Jack Vincennes (Kevin Spacey), um homem egocêntrico e corrupto, faz um acordo com o dono de uma revista de fofocas (Danny DeVito) para que ele acompanhe-o num flagrante de uso de drogas de um famoso ator de Hollywood, de modo que ele possa estampar as manchetes policiais do dia seguinte.
  • Bud White (Russell Crowe), um sujeito conhecido tanto por sua truculência quanto por sua sensibilidade com as mulheres, realiza uma prisão por violência domiciliar e depois para em um bar para comprar bebidas para a festa que o aguarda no fim do expediente. Enquanto aguarda o atendimento, Bud presencia uma situação suspeita envolvendo um homem e uma garota com o nariz enfaixado e o episódio torna-se o início de uma longa investigação.
  • Ed Exley (Guy Pearce) é um jovem determinado que está ingressando na polícia. Para superar a sombra do pai, que foi uma referência dentro da corporação, ele está disposto a fazer o que for necessário para conquistar a confiança de seus superiores, inclusive denunciar os corriqueiros abusos e desvios de conduta de seus colegas de profissão. Quando Jack Vinceness e Bud White envolvem-se em uma briga generalizada com um bando de detentos, Exley recebe a chance de subir alguns degraus rumo ao topo da hierarquia da instituição.

Los Angeles - Cidade Proibida - CenaEm suas poucas mais de 2 horas, Los Angeles – Cidade Proibida entrelaça a história dos 3 policiais e mostra como seus destinos foram moldados por suas fraquezas de caráter e pelas forças superiores que estavam em jogo naquele período. A queda de Mickey Cohen provoca uma guerra na cidade e somente no final é possível descobrir quem de fato estava manipulando todos para chegar ao poder (o que acontece em uma daquelas reviravoltas clássicas de roteiro), mas fica bem claro que, independente de qualquer armação que fazem contra os personagens, são eles os grandes responsáveis por todas as desgraças que caem sobre suas cabeças.

Los Angeles - Cidade Proibida - Cena 3Trabalhando então com o que convencionou-se chamar de “personagens cinzas”, sujeitos que não são nem bons nem ruins, o diretor faz-lhes trilhar um longo caminho através dos cantos mais obscuros de Los Angeles antes que eles possam encontrar a redenção. A história de Vinceness é um pouco mais “rápida” e menos interessante do que a dos outros (o passado dele é pouco explorado), mas é acompanhando-o pelos bastidores dos estúdios que encontramos algumas das melhores referências ao período que ficou conhecido com a Era de Ouro de Hollywood. A prisão que o personagem efetua logo no começo, por exemplo, é uma bem elaborada recriação de um escândalo envolvendo o ator Robert Mitchum (de O Mensageiro do Diabo), que foi detido na vida real por posse de drogas.

Los Angeles - Cidade Proibida - Cena 4Bud e Exley, que no início parecem entender a lei de formas completamente distintas, acabam revelando afinidades e, ainda que não seja exatamente uma surpresa o fato de eles acabarem unindo forças, é bem legal ver caras com interesses tão diferentes trabalhando juntos. Exley é detestável, mas é inegável que ele protagoniza a melhor cena do filme (a engenhosa sequência do interrogatório) e que, quando necessário, ele sabe deixar os melindres da burocracia de lado para explodir alguns bandidos com uma poderosa espingarda. Já Bud, que nos é apresentado como um barril de dinamite ambulante, mostra um lado mais emotivo ao revelar o porque de seu protecionismo para com a as mulheres e então engata um romance com a bela Lynn Bracken (Kim Basinger), mas isso não o impede de despejar toda a sua raiva no tiroteio mortal que encerra o filme.

Los Angeles - Cidade Proibida - Cena 5Los Angeles – Cidade Proibida tem todos esses bons personagens cujas incoerências refletem aqueles problemas que os cartões postais das cidades ignoram e é bem gostoso de ser assistido pela presença constante de elementos da história de Hollywood (há um bordel na cidade cujas ‘funcionárias’ são todas sósias de atrizes famosas como a Rita Hayworth) e pela pegada de investigação policial que rende boas cenas de tiroteios e interrogação. Achei o desfecho dado ao Bud White meio improvável e fiquei um pouco impressionado com a aparente facilidade com que alguns bandidos fogem da prisão em um determinado momento, mas o saldo é positivo e, no término da sessão, é possível entender porque o filme concorreu a impressionantes 9 Oscars na cerimônia de 1998 (levou 2: Melhor Atriz Coadjuvante e Melhor Roteiro Adaptado) e porque ele aparece na respeitável 100º posição do Top 250 do IMDB.

Los Angeles - Cidade Proibida - Cena 2

Noé (2014)

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NoéPerdoe-me pai, pois eu pequei e, ciente do meu erro, aceito de coração aberto essa punição que o Senhor me enviou em forma de filme. Há menos de um ano, no meu texto sobre o Guerra Mundial Z, relatei uma experiência terrível que eu tive no Cinemais em um dia de ingresso promocional. Naquela ocasião, entre brados e praguejamentos, prometi evitar o estabelecimento a todo custo nos dias de quarta feira mas, infelizmente, não consegui manter a promessa, motivo pelo qual eu me ajoelho diante de ti, ó pai, e peço-lhe: castigue-me, colocando do meu lado pessoas que fazem comentários medíocres durante todo o filme, eu mereço, mas devolva o talento do Darren Aronofsky, ó Senhor, ele é bom demais para ser punido com tamanho lapso criativo!

Rogo tão apaixonadamente pelo diretor de Pi, Fonte da Vida e Cisne Negro porque o considero um dos melhores profissionais do ramo produzindo atualmente em Hollywood e não quero acreditar que o que eu vi essa semana seja um indício de fadiga criativa. Mesmo considerando a dificuldade a priori que é adaptar a história (ou mito) de Noé devido a seus muitos absurdos, é preciso reconhecer que o trabalho do cara ficou abaixo da linha do aceitável.

Para quem não está por dentro da trama, Noé (Russell Crowe), filho de Lameque, neto de Matusalém (Anthony Hopkins) é encarregado pelo Criador, que fala-lhe através de um sonho, de construir uma arca para garantir a continuidade da vida no planeta. Em breve, lhe é revelado, um dilúvio implacável cairá dos céus, destruindo tudo e todos, como forma de punição à maldade que os homens espalharam pelo planeta. Mesmo desacreditado, Noé obedece as ordens e inicia a construção, o que lhe rende alguns inimigos e conflitos familiares.

Noé - CenaA “Arca de Noé” é uma dessas histórias que mesmo quem nunca leu a bíblia certamente já ouviu falar alguma vez na vida. Pessoalmente, e com todo o respeito que é possível um agnóstico ter para com o referido livro, eu considero-a como um dos maiores absurdos lá contidos, e olha que, avaliando o conteúdo como um todo, isso coloca-a em um patamar de bizarrice quase esquizofrênica. O meu ponto é: fé e racionalidade precisam dialogar. Olhar para a história de Noé e perceber as alegorias do discurso e tirar disso algum ensinamento é saudável, já acreditar literalmente que um homem construiu uma arca gigantesca e nela abrigou um casal de cada um dos animais do planeta é, no mínimo, preocupante. Todo caso, digo isso mais para deixar claro o que eu penso a respeito da tal história e fundamentar a minha crítica do que para zombar da crença alheia, ok?

Noé - Cena 2Dito isso, devo acrescentar que acreditei em Noé até o último minuto. Deixei de lado a minha descrença pessoal relacionada a história e a péssima impressão que o trailer me causou e fui no cinema para ver um filme da dupla Aronofsky/Crowe. Confio no poder de entrega e construção de personagens do ator desde que vi Uma Mente Brilhante e do diretor eu sempre espero uma visão complexa e desafiadora de histórias/temas já conhecidos. Em outras palavras, eu queria ver o que o Aronofsky tinha a dizer sobre Noé e como o Crowe iria representar um personagem que carrega em si uma ambiguidade tão grande. A decepção começou aqui: a adaptação do diretor é demasiadamente literal.

Introduzida por textos e imagens que retornam à Adão e Eva para explicar a origem do mal no mundo, a trama desenvolve-se posteriormente em cima dos eventos citados na bíblia: a revelação, a construção da arca, o dilúvio e o início do repovoamento. Do início ao fim, vemos Noé, sua esposa (uma Jennifer Connelly equivocadíssima no papel) e seus filhos vagando por terras arenosas e desertas buscando cumprir as ordens do Criador. O elemento fantástico, característica presente em diversas passagens da bíblia, como na Travessia do Mar Vermelho, é aproveitado por Aronofsky para criar seres gigantescos a la Transformers chamados Guardiões que auxiliam Noé em sua empreitada. É isso que vemos aqui: andanças intermináveis, a construção da arca, uma cena de batalha genérica épica (lugar comum nos filmes de ação atuais) entre Noé, os Guardiões e os chefes de tribos humanas, o dilúvio e… o repovoamento, tal qual está no livro. O tal ponto de vista diferente que eu esperava aparece, timidamente, apenas nos dilemas enfrentados pelo protagonista.

Noé - Cena 4Noé é escolhido devido a sua bondade pelo Criador (e continuo me referindo a ele dessa forma pois é assim que ele é tratado no filme; salvo engano, não falam em “Deus” em nenhum momento) para salvar os animais e a inocência do mundo. Descendente direto de Sete, um dos filhos de Adão, o personagem, contraditoriamente, acaba sendo responsável (ainda que indireto) pelo fim da humanidade tal qual ela era conhecida até então já que, avisado de que o mundo iria acabar, ele não deixa ninguém além de sua própria família entrar na arca. O peso dessa tarefa perverte a mente do homem, que vê-se em uma situação onde ele precisa deixar de lado a própria bondade que o destacou entre os demais para cumprir o plano que lhe foi revelado em sonhos. Crowe brilha no papel e constrói um personagem atormentado, por vezes até odioso, que é dobrado diante dos ditames divinos. A eterna luta entre fazer o que se deseja ou aquilo que é certo está muitíssimo bem representada aqui, mas é só isso que Noé tem a oferecer, e isso é muito pouco.

Noé - Cena 5Aronofsky fez um filme burocrático sobre uma história absurda. O que deveria ser, essencialmente, um drama sobre os conflitos morais de um homem, transformou-se em um filme de diálogos arrastados e pouco inspirados e cenas de ação meia boca cuja única passagem realmente memorável é aquela sequência que dá conta da criação do universo e da vida. Assisti esse perrengue do lado de um sujeito que narrou TODO o filme para a namorada dele. Excluindo-se a chance quase nula de a moçoila ser cega, só me resta aceitar a atitude do sujeito como uma punição por eu não ter cumprido a minha palavra. “Olha lá amor, agora ele vai morrer!” ARGH!

Noé - Cena 3

O Homem de Aço (2013)

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O Homem de AçoEu gostei do Superman – O Retorno. Adoro a cena do salvamento do avião e, mesmo depois de 7 anos e muito títulos de ação semelhantes assistidos, ainda a considero como um dos feitos mais impressionantes/cool já realizados por um herói na telona. Não serei eu a discordar, no entanto, da principal crítica feita na época ao trabalho do Bryan Singer: excluindo a cena citada, faltou ação no filme. O Lex Luthor, inimigo clássico do herói, apesar de muitíssimo bem interpretado pelo Kevin Spacey, não conseguiu fornecer um desafio físico à altura dos poderes do azulão. Optando por uma continuação direta dos filmes estrelados pelo Christopher Reeve, Singer e sua equipe realizaram um trabalho tão nostálgico quanto repetitivo para quem conhecia os longas antigos e, ao que tudo indica, também não agradaram o público atual de filmes de ação, pessoas acostumadas a sequências de pancadaria frenéticas com cortes constantes e efeitos especiais exagerados. Com uma bilheteria que mau pagou os custos de produção, O Retorno, que tinha tudo para resgatar as aventuras do personagem em uma época onde as pessoas mostram-se interessadas em filmes de super-heróis, acabou transformando-se no ponto final da cine-série iniciada em 1978 pelo diretor Richard Donner.

Obviamente, o personagem, um dos mais conhecidos e rentáveis da DC Comics, não ficaria esquecido muito tempo pela indústria hollywoodiana. Dentre todas as especulações que surgiram sobre o projeto de levar o Super Homem de volta às telas, a que mais me agradou foi a possibilidade do Zack Snyder ser convidado para a direção. Para dizer pouco, o cara é um dos diretores mais criativos, se não o mais, que debutou em terras americanas nesse século. Para escancarar a minha admiração, Watchmen é um dos meus filmes favoritos e considero-o como uma das melhores adaptações de HQ’s já feitas para o cinema. O que era boato foi anunciado oficialmente e a expectativa, que à partir desse momento era gigantesca, foi alçada ao status de “monstruosa” quando Christopher Nolan, o responsável pela trilogia do Cavaleiro das Trevas, foi confirmado como um dos roteirista do reboot. Sim, reboot, pois também ficou decidido que O Homem de Aço desconsideraria os filmes anteriores do personagem para contar sua história desde o início.

O Homem de Aço - Cena 4

Essa história, caros leitores, começa no longínquo planeta Krypton, lar de uma sociedade avançadíssima porém condenada a extinção devido a exploração indevida de recursos naturais. Jor-El (Russell Crowe) sugere que os anciões do planeta procurem a salvação dos kryptonianos explorando outros planetas mas, antes mesmo que a proposta possa ser seriamente discutida, o General Zod (Michael Shannon) toma o poder com a ajuda de um golpe militar. Temendo a segurança do filho recém nascido, Jor-El envia-o em uma cápsula para a Terra, onde ele é encontrado e adotado pelo casal Martha (Diane Lane) e Jonathan Kent (Kevin Costner). Batizado Clark Kent (Henry Cavill), o extraterrestre cresce em nosso planeta procurando manter sua identidade e seus poderes escondidos, tarefa na qual ele é bem sucedido durante os primeiros 33 anos de sua vida errante, no final dos quais o mesmo Zod localiza-o e exige que nossas autoridades entreguem-no. Clark, cuja verdadeira história havia sido parcialmente descoberta pela repórter Lois Lane (Amy Adams), vê-se então dividido entre juntar-se ao que sobrou da sua raça, já que Krypton fora destruída logo após sua partida, ou usar seus poderes e lutar para proteger a Terra dos invasores.

O Homem de Aço - Cena 5

Quando finalmente falou como diretor oficial do longa, o Zack Snyder fez questão de dizer que sempre vira o Super Homem como um herói de grande força física e que era assim que ele o mostraria na tela. Logo após, surgiu uma imagem do personagem próximo a um caixa-forte todo retorcido. O recado era claro: O Homem de Aço, ao contrário de O Retorno, teria MUITA ação. Na época, lembro de ler comentários de fãs temerosos de que o diretor transformasse o filme em outro Sucker Punch, ou seja, que a forma suprimisse o conteúdo, que a ação espetacular, que o diretor inquestionavelmente sabe como fazer, não viesse acompanhada de um bom roteiro que a justificasse e complementasse. Regozijem-se, desconfiados, o que os aguarda no próximo dia 12 é um épico de 2h30min que não apenas cumpre a promessa de batalhas grandiosas como reserva tempo suficiente para diálogos e passagens que desenvolvem muitíssimo bem o personagem e o mundo no qual ele está inserido.

O Homem de Aço - Cena 2

Ao lado da pancadaria frenética, que comento no próximo parágrafo, acredito que o principal mérito de O Homem de Aço seja sua narrativa. O filme começa, Krypton e o núcleo envolvendo o ator Russell Crowe desaparecem rapidamente e, mais rápido ainda, ficamos sabendo que Jonathan Kent morreu, motivo que levou Clark a vagar pelo mundo. Aquela sensação incômoda de que estão correndo com a história para irem direto para a ação, felizmente, não dura muito: a medida que Clark vai enfrentando algumas provações, flashbacks vão sendo introduzidos para contextualizarem as cenas. É aí que atores como Kevin Costner e Diane Lane tem a chance de mostrarem seu talento, emocionando com suas performances seguras e discursos inspiradores, e é aí também que o Zack Snyder começa a provar que sua escolha não foi um equívoco. Extremamente sensível ao poder dos detalhes e da trilha sonora, como pode ser visto no já citado Watchmen, o diretor cria imagens lindas em meio as cenas de batalha, como aquela que pode ser vista no trailer quando o pequeno Clark brinca em seu quintal acompanhado  por um cachorro. A capa vermelha, o sol, a borboleta pendurada no balanço… Snyder faz poesia com imagens.

O Homem de Aço - Cena 6

Sobre a ação, na impossibilidade de descrevê-la com palavras que mostrem a minha empolgação sem revelar o que será visto, contentarei-me em dizer que eu não consigo imaginar como poderia ser melhor. Desde a furtividade adotada nas cenas do Jor-El e da Lois Lane, passando pela aprendizagem dos poderes (ah, aquele primeiro voô!) até a mega, hiPER, ULTRA sequência de luta entre o Super Homem e os kryptonianos, Snyder oferece aqui o que há de melhor no estilo. Barras de aço são retorcidas, caminhões são arremessados e corpos atravessam edifícios como consequência dos combates épicos entre os personagens. Os cortes são rápidos quando precisam ser, mas na maioria do tempo ele permite que o espectador veja, de fato, o que está acontecendo na tela. O uso do slow motion, talvez a característica mais marcante do estilo do diretor desde o 300, é reduzido mas feito com muito bom gosto, como quando finalmente Zod e Super Homem encontram-se no campo de batalha para a esperada e inevitável troca de sopapos. Durante o primeiro soco cruzado, o recurso torna possível ver detalhes dos uniformes (aliás, que seja dado um prêmio para quem teve a idéia de excluir a cuequinha do uniforme do herói), suor em suas faces e raiva, medo e esperança nos olhos de ambos.

O Homem de Aço - Cena 3

Como não conheço a HQ, não pude notar referências as mesmas, mas o pessoal do IMDB afirma que algumas das melhores histórias do azulão ganharam citações no longa. O que vi sem muito esforço foi a comparação do personagem com Jesus Cristo. A metáfora, aparentemente inocente, tendo em vista que os dois seriam figuras messiânicas responsáveis pela salvação da humanidade, esconde uma provocação religiosa sobre a origem de nossos deuses que, assim como no Prometheus, teriam origem extraterrestre e provocariam a adoração das pessoas não por sua qualidade divina, mas sim por serem diferentes e mais poderosos do que as pessoas de nosso planeta.

Assim como recomendo que vocês assistam O Homem de Aço no cinema, preferencialmente em 3D, já que o recurso foi bem empregado, também recomendo que vocês não o façam do lado de vossas namoradas. Caso isso não seja possível, levem-nas, mas mandem-nas comprar pipoca logo após a cena do salvamento no petroleiro. O ator Henry Cavill malhou durante 8 meses para o papel com o mesmo cara que conduziu os treinamentos físicos do 300. No momento citado, ele aparece sem camisa (e em 3D). Não é o tipo de coisa que uma namorada precisa ver, acreditem.

Obs.: Impressão minha ou o primeiro combate do filme acontece exatamente no mesmo posto de gasolina usado no Superman – O Filme?

O Homem de Aço - Cena

O Informante (1999)

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Algumas das maiores frustrações da minha vida foram descobrir que:

  1. Os caras do Aerosmith usavam (?) drogas.
  2. Meninas não dão valor em um save de Final Fantasy X com mais de 180 horas.
  3. A imparcialidade não existe.

Qualquer pessoa que tenha lido um ou dois textos sobre subjetividade e imparcialidade sabe que a simples escolha do tema que será desenvolvido/publicado implica necessariamente adotar uma posição. Colocar o Luciano Huck e a Angélica na capa de uma das revistas de maior circulação nacional enquanto uma revolução ocorria no Egito, por exemplo, foi uma escolha, um posicionamento. Tomamos decisões o tempo todo, escolhemos certas coisas em detrimento de outras, mas existem casos onde essas escolhas podem ser feitas com a intenção clara de manipular a opinião pública, como no famoso caso da edição do debate entre Collor e Lula de 1989 feito pela Rede Globo que influenciou diretamente no resultado da eleição.

O Informante, dirigido pelo Michael Mann, é um filme que toca nessa questão da responsabilidade que a imprensa tem que ter na relação com o público. Jeffrey Wingand (Russell Crowe) começa o filme sendo despedido do cargo  de vice presidente de uma empresa da indústria do tabaco. Ao mesmo tempo, o jornalista Lowell Bergman (Al Pacino) recebe um dossiê contendo informações técnicas que poderiam comprovar que as indústrias estavam manipulando a nicotina nos cigarros para viciar os consumidores. Bergman procura Wingand e pede para que ele o ajude no caso. Quando Wingand revela que conhece segredos que poderiam encriminar e responsabilizar os donos das empresas, Bergman decide gravar uma entrevista com o ex-vice presidente para revelar ao mundo aquilo que ele considera um “caso de saúde pública”. Wingand, que tinha um contrato de confidencialidade com sua ex-empresa, passa a sofrer ameças e é vítima de campanhas de desmoralização pública. Bergman, ao tentar levar a entrevista ao ar, percebe que interesses econômicos interpõe-se entre o público e a “verdade”.

O Informante pode até ter a pegada de filmes de teoria da conspiração mas, salvo as adaptações feitas para valorizar o drama, ele é baseado na história real da luta de Jeffrey Wingand contra a Brown & Williamson, uma das gigantes da indústria do tabaco dos EUA que teriam despedido Wingand por ele discordar do uso nos cigarros de substâncias cancerígenas. O filme de Mann é baseado nas informações do próprio Wingand, as quais também não podem ser aceitas integralmente (tanto que o diretor não aceitou, mudando várias coisas e personagens, o que causou polêmica na época do lançamento) porque ele envolveu-se emocionalmente no processo. Por mais que a dramatização simplifique o problema colocando dois heróis contra um vilão representado pelo “sistema” em uma disputa emocionante repleta de discursos inflamados e pessoas inescrupulosas, o grande mérito do filme é instigar o espectador a analisar as fontes das notícias que chegam até ele e considerar que, muitas vezes, não há apenas o interesse de informar por trás de tais notícias.

Mann conduz bem o espectador ao longo das 2h37min de filme. Tendo estruturado a história em cima dos diálogos e das atuações magníficas de Pacino e Crowe, o diretor não comete os tradicionais usos de câmeras de mão e zooms explícitos, tendência que infelizmente ele não seguiu em seus trabalhos posteriores. Acredito que, mesmo para quem não gosta de História e Jornalismo, O Informante é um filme gostoso de ser assistido, sem dúvida um dos melhores trabalhos do diretor.

OBS: Apesar dos pesares, OBRIGADO a Veja por ESCOLHER esse filme para ser lançado na Coleção Cinemateca Veja e ao amigo Antônio Carlos por me presentear com uma cópia =)

72 Horas (2010)

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O filme começa com uma mulher reconhecendo falando que os homens são melhores nos cargos de chefia e que todas as mulheres competem entre si (+1 ponto). Em seguida, outra mulher é presa acusada de matar a própria chefe com um extintor de incêndio (+5 pontos, 2 pelo fator HELL YEAH!). O marido (Russell Crowe), acreditando na inocência da moça, tenta libertá-la através dos meios legais. Quando ele percebe que a causa está praticamente perdida, ele vai até uma biblioteca e é nesse momento que pensamos: Pronto! Lá vem o clichê do americano autodidata que estuda um livro sobre direito e dá uma aula em advogados com anos de experiência. E … não! Ele, que até aquele momento era um cidadão exemplar, usa o Google (!!!) para aprender métodos ilegais para tentar tirar a esposa da cadeia! (+ 10 pontos).

72 Horas, dirigido por Paul Haggis (Crash – No Limite) tem um começo promissor. Além da história interessante, os personagens são legais e os diálogos são cheio de ironias (a cena do café da manhã em família que antecede a prisão da moçoila me fez rir bastante). Só que, passado esse começo legal, o filme tanto cai em uma séria infinita de clichês que zeram todos os pontos acumulados com o espectador no início quanto exige que aceitemos certos absurdos no roteiro para que ele não perca a graça.

A premissa de um cidadão honesto que resolve agir fora da lei é legal e torna-se mais interessante ainda quando vemos um personagem inexperiente e que comete erros, mas perde a credibilidade quando esse mesmo cara bola um plano de fuga tão ou mais improvável que as armadilhas do Esqueceram de Mim. Junte a isso uma das cenas mais improváveis da história recente do cinema (a cena do carro), um Russell Crowe longe de seus melhores momentos e um final bastante irregular e temos um filme no mínimo decepcionante, não porque seja ruim, mas porquê, pelo que pode ser visto no começo, poderia ser BEM melhor.