Arquivo da tag: Prelúdio

Prometheus (2012)

Padrão

AVISO: Gostei muito de Prometheus e o considero, ao lado do Os Vingadores, como o melhor filme do ano. Se ainda estiver em cartaz em sua cidade, vá assistí-lo no cinema, vale muito a pena. Caso você ainda não tenha assistido e não goste de SPOILERS, não recomendo a leitura do texto: há certas coisas na história sobre as quais eu simplesmente PRECISO comentar e isso pode estragar algumas surpresas. Aviso dado, vamos então ao roteiro do tão comentado retorno do diretor Ridley Scott ao universo da ficção científica.

Quem assistiu o trailer do longa certamente deve lembrar-se que anunciavam-no como “Do diretor de Gladiador e Blade Runner“, anúncio esse que visa dois públicos distintos: o espectador de final de semana lembrará-se das lutas do General Maximus e os mais dedicados, além de saberem que a carreira do Harrison Ford não foi feita só de Star Wars e Indiana Jones, notarão que a jóia da coroa da filmografia do Ridley Scott foi deixada de lado. Assim como não tenho a menor dúvida de que série Alien é mais conhecida do que o Blade Runner, também não tenho dúvida de que deixaram o nome dos alienígenas de lado no trailer em uma tentativa de não entregar parte das muitas surpresas do filme. É claro que, em tempos de internet, um “segredo” desses não passaria despercebido e, muito tempo antes da estréia, qualquer pessoa que acessa sites sobre cinema já sabia que Prometheus  funcionaria como um prelúdio para o Alien – O Oitavo Passageiro, primeiro filme da série e o único até o momento dirigido pelo Ridley Scott.

O trailer, aliás, também não era sincero em outro aspecto: no gênero. Ao contrário do que tentaram vender, Prometheus não é um filme de terror, pelo menos não mais do que o era o primeiro Alien. O foco aqui não é o “monstro” em si ou o estrago que ele possa causar, mas sim o mistério que o cerca e todas as possibilidades que o fato de estar em um mundo completamente diferente trazem. O tal “mistério”, aliás, começa logo na primeira cena, momento onde o branquelão acima contempla o infinito do alto de uma cachoeira e, após consumir uma matéria negra, morre e cai na água. O DNA do sujeito começa a sofrer mutações, desenvolver-se para estruturas cada vez mais complexa e… temos aí o início da vida, esse sujeito é o nosso Deus!

Durante a sessão, eu ouvi uma menina que estava sentada na fileira de trás dizer “que filme difícil de entender!” e, no final, uma outra declarou “os efeitos especiais são bons, mas eu não entendi nada”. Prometheus, enquanto história tradicional com começo, meio e fim é um filme atrativo, os efeitos especiais realmente são muito bons (eu adorei aqueles trecos que emitem luzes vermelhas para mapear a caverna) e o elenco que contém nomes como Charlize Theron, Noomi Rapace, Michael Fassbender e Guy Pearce não poderia ser melhor. Não trata-se, no entanto, de cinema entretenimento, daquele tipo de filme para tu assistir, sair da sala de cinema e esquecer. Ridley Scott debruçou-se sobre algumas questões existencialistas que não são do interesse de todos e, por isso mesmo, não serão compreendidas por todo mundo, mas realmente vale a pena perguntar-se o que aqueles personagens e situações representam dentro da trama. Eis o que, na minha humilde opinião, é dito em Prometheus.

Nós não somos frutos do criacionismo muito menos de um lento processo de evolução iniciado pelo Big Bang. A vida na Terra começou quando o braquelão morreu e teve seu DNA misturado com a água e outros elementos de nosso planeta. A substância negra que o mata, aparentemente, seria o mal em essência, mal esse que é misturado ao conteúdo genético do alien e que iria ser parte da constituição da vida na Terra, ou seja, houve uma falha, um erro no momento da criação que é a responsável direta por toda a maldade existente no mundo. Várias civilizações, de uma forma ou de outra, identificaram os aliens como sendo nossos criadores e registram isso através de desenhos e pinturas que, milhares de anos depois, foram descobertos pela tripulação da nave Prometheus. Identificadas como um mapa estelar, as estrelas desenhadas pelos seres primitivos de nosso planeta são utilizadas para justificar uma viagem para outro planeta em busca de nossos criadores. O problema é que nossos criadores não ficaram satisfeitos com o trabalho que eles fizeram e estavam dispostos a retornar aqui para recomeçar… do zero.

A equipe do Prometheus encontra então nossos deuses hibernando em um outro planeta, mas encontra também a essência do mal que comprometeu nossa criação. Essa essência é misturada novamente ao DNA humano em uma tentativa do andróide David (Michael Fassbender) de encontrar algum sentido para sua vida, de ser ele mesmo um deus. O experimento, que é abortado em uma cena agoniante protagonizada pela cientista Elizabeth Shaw (Noomi Rapace), dá origem a uma outra espécie, mais malévola ainda, que, no final, consumindo ela o corpo de um dos nossos criadores, dá origem ao Alien que nós conhecemos, um misto de divindade, humanidade e maldade pura que alguns anos depois seria o oitavo passageiro de uma aeronave qualquer.

Nós, portanto, somos o produto de um erro e, por isso mesmo, nosso deus (ou deuses) tentam nos destruir. O retorno a ficção científica do Ridley Scott, além de produzir cenários lindíssimos enriquecidos pelo uso do 3D, coloca em debate o conceito de perfeição divina e do livre arbítrio. Cada um entenderá algo e acreditará no que quiser (ou no que o seu conhecimento lhe permitir), mas é inegável que a discussão é sempre positiva. Por tudo isso, afirmo que Prometheus é um dos mais importantes e instigantes filmes do gênero dos últimos tempos.