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13 Minutos (2015)

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13-minutosPassaram-se quase 3 anos desde que vi os bons Tanta Água e Os Bastardos no Cine Cultura de Brasília. Depois disso, até estive na capital outras vezes, mas sempre a trabalho e numa correria do cão, de modo que não consegui tempo para retornar ao cinema. Esse ano, felizmente, a empresa alterou o horário dos meus voos e eu acabei tendo uma tarde inteira livre para fazer o que eu bem entendesse. Não tive dúvidas: fui do aeroporto direto para o shopping Liberty Mall, almocei e depois dirigi-me para a bilheteria do Cine Cultura.

Nunca deixarei de admirar aquele lugar: a decoração é muito convidativa (há imagens de clássicos do cinema espalhadas por todo lado), os funcionários são educados, as salas de projeção são pequenas e intimistas e a programação sempre preza por títulos fora do circuito comercial. Desta vez, para tornar a experiência ainda mais completa e satisfatória, tive o prazer de visitar o cinema bem no meio de um festival, o 5º BIFF, Brasília International Film Festival ou Festival Internacional de Cinema de Brasília. Dentre outras coisas, o festival está promovendo competições de documentários e longas de ficção, exibindo animações, homenageando o diretor italiano Sergio Leone e lançando vários títulos, dos quais consegui ver dois: este 13 Minutos e o Mestre dos Gênios. Parabenizo aqui os responsáveis pelo Cine Cultura e pelo BIFF pelo excelente trabalho e, sem mais delongas, inicio esta resenha.

Dos muitos longas que eu poderia ter assistido, escolhi esse 13 Minutos tanto porque o horário favoreceu quanto porque o tema dele (nazismo e Segunda Guerra Mundial) é algo que está diretamente ligado com o conteúdo que estou lecionando para as minhas turmas do colegial, ou seja, mais uma oportunidade de aprender e enriquecer as minhas aulas. Eu até já tinha ouvido falar da audaciosa história do alemão Georg Elser, mas o filme, que é do diretor Oliver Hirschbiegel (o mesmo do A Queda! As Últimas Horas de Hitler), me ajudou a compreender melhor as motivações do homem que tentou assassinar o Führer alemão.

13 Minutes MovieSim, “tentou”, porque não é exatamente um SPOILER dizer que o cara não conseguiu, visto que é de conhecimento geral (ou pelo menos é a teoria mais aceita) que Hitler não foi assassinado, mas sim cometeu suicídio no final da guerra, em abril de 1945, para não cair nas mãos do exército soviético. Ciente, portanto, que não contava com uma novidade para o clímax de sua trama, Hierschbiegel já começa o filme mostrando a tentativa de assassinato, que deu-se em 8 de novembro de 1939 durante um discurso de Hitler em Munique. Georg Elser (Christian Friedel) construiu e escondeu uma bomba no palanque onde o Führer iria discursar. Conforme programado, o dispositivo foi acionado as 21h20 daquele dia, matando 8 pessoas e deixando dezenas de feridos. Hitler, que havia deixado o local 13 minutos antes devido a uma alteração climatológica no aeroporto, saiu ileso.

Georg Elser foi preso poucos minutos após a explosão e levado para ser interrogado pela Gestapo. Cercado pelos impiedosos Arthur Nebe (Burghart Klaubner) e Heinrich Müller (Johann von Bülow), Elser tenta convencer seus algozes de que agiu sozinho e sem orientação de nenhuma organização, mas eles não acreditam e torturam-no de todas as formas possíveis para conseguir uma confissão. Enquanto mostra-nos o personagem sofrendo uma série de abusos físicos e psicológicos, o diretor vale-se de digressões e flashbacks para contar o que levou Elser a atentar contra a vida de Hitler.

13-minutos-cenaCarpinteiro, boêmio e cheio de problemas familiares para resolver, o Georg Elser visto no filme não era exatamente uma pessoa engajada na luta contra o nazismo (o verbete dele no Wikipédia mostra algo um pouco diferente). Elser certamente percebia as mazelas provocadas pelo nacional socialismo alemão, como os salários baixos e a violência praticada pelo estado contra seus opositores, mas seus esforços estavam todos concentrados em seu trabalho, no alcoolismo do pai e nas mulheres, como a provocativa Elsa (Katharina Shüttler). Esta indiferença política começa a acabar quando um dos amigos do personagem, que era filiado ao Partido Comunista, é preso e enviado para um campo de concentração.

13 Minutos traz pelo menos 2 considerações importantes sobre os fatos que aborda. Primeiro, há a tradicional porém indispensável crítica ao regime totalitário alemão, responsável direto pela eclosão da Segunda Guerra Mundial e pela morte de milhares de pessoas. O diretor mostra a escalada da intolerância e da violência travestidas de nacionalismo na Alemanha em cenas variadas, como quando uma mulher é humilhada em praça pública por relacionar-se com um judeu. Esse tipo de sequência, bem como aquelas dedicadas a retratar o cerceamento da diversidade política (a briga no bar, por exemplo), incomoda bastante porque é perfeitamente possível estabelecer paralelos entre o nazismo e coisas que estamos vendo atualmente no nosso no dia a dia. Lixamento público, principalmente na internet, tornou-se algo comum para demonstrar insatisfação com alguém. A tentativa de criminalização das políticas de esquerda (levianamente definidas por muitos como ‘comunismo’), por outro lado, é uma realidade incômoda nesse momento de recessão econômica. Por mais clichê que isso possa soar, é fundamental aprendermos com os erros da história para que eles não sejam repetidos.

13-minutos-cena-3O outro ponto interessante no roteiro é a forma como o diretor constrói o protagonista. Georg Elser pode até ter tido uma iniciativa nobre (ainda que questionável), mas em momento algum Hierschbiegel tenta vendê-lo como um herói. Além de só ter prestado atenção na desgraceira que estava ao seu redor após ter sentido na própria carne as garras do nazismo, Elser foi um sujeito capaz de abandonar uma mulher e um filho e de seduzir a esposa de outro homem. Sem absolutamente nenhum tipo de moralismo, o diretor ainda nos faz pensar uma outra questão: e as 8 pessoas inocentes que foram mortas pelas explosão que deveria ceifar a vida do Hitler? Esse tipo de raciocínio calculista (matar um/poucos para salvar milhões) não é exatamente o mesmo tipo de pensamento encontrado por trás de várias atrocidades nazistas?

Vi 13 Minutos logo após almoçar e não aconselho que vocês façam o mesmo. Além de não ser fácil digerir todas as provocações do roteiro, é preciso ter estômago para acompanhar as cenas de tortura do longa. Imagine tu com a barriga cheia vendo uma agulha quente sendo introduzida debaixo da unha do personagem. Agora imagine vê-lo vomitando de dor. Melhor não, né? Todo caso, reserve um tempo para assistir 13 Minutos (de preferência no Cine Cultura, se o leitor for de Brasília): trata-se de um filme bastante informativo sobre eventos do passado que tem mostrado-se assustadoramente atuais.

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